Thursday, February 08, 2007


Luto

Hoje vi na tv uma notícia muito, muito triste.
Ela envolvia um assalto a um carro, que continha três passageiros.
Os bandidos armados fizeram a família sair do carro, mas o menino de seis anos ficou preso no cinto.
A mãe, desesperadamente tentou soltar o filho, mas não conseguiu. Os bandidos saíram. O menino ficou preso do lado de fora do veículo.

O crime se estende bem além do trecho onde parei, mas não posso mais transcrevê-lo, porque dói muito.

Chorei por muito tempo mesmo. Nunca chorei tanto assistindo à tv. Chorei do início ao fim, e além. Chorei ainda mais quando descobri que os bandidos suspeitos de cometeram crime tão imensuravelmente cruel eram apenas meninos. O mais velho tinha 18 anos. O mais novo era menor de idade.

Meninos.

O que levou estes jovens a cometer tamanha brutalidade?
Medo? Drogas? Desespero?
O que será que eles sentiram quando perceberam o que estava se passando? O que os levou a continuar?
Que pessoas passaram pela sua cabeça nesse momento?
Qual o tamanho da dor que ardeu em seus estômagos depois?

Lembrei que eram seres humanos.
Lembrei que muitas vezes fiz o que não devia, o que não queria, o que me avisaram que era pra não fazer, o que sabia que não era o correto, o que podia machucar alguém.
Não será esta força que nos move ao erro a mesma que moveu os bandidos a agirem de maneira tão desesperadamente estúpida?

Nós, humanos, somos burros.
Nós, humanos, somos frágeis.
Nós, humanos, queremos ser vistos e admirados, temidos e respeitados.
Porque nós, humanos, tememos a indiferença.
Nós, humanos, somos egoístas e orgulhosos.
Nós, humanos, agimos inconseqüentemente.
Nós, humanos, nos arrependemos das coisas e deixamos que pensem que não.
Nós, humanos, nem sempre sabemos perdoar.
Não somos bonzinhos.
Não somos exemplo.
Somos movidos apenas de curiosidade e adrenalina, tentativa e erro.
Nós, todos nós, somos apenas humanos.

Somos todos pobres meninos.
Meninos.

No final de tudo, só consegui proferir uma palavra: “lamentável”.

Lamentei tudo o que posso ser e não sou, mesmo com todas as oportunidades que a vida me concedeu. Será que eles tiveram as mesmas oportunidades?

Lamentei as vezes que fui intolerante com os meus pais. Será que eles tiveram pais tão bacanas quanto os meus?

Lamentei não ter ensinado tudo o que podia a todos que poderiam aprender.

Lamentei não ter aprendido tudo o que podia de todos os que poderiam me ensinar.

Lamentei a minha espontânea insignificância.

Luto, a partir de hoje.
Luto para ser e oferecer o melhor de mim.
Luto, para dar à vida daquela criança o significado que ela merece.
Luto para ter a dignidade de dizer que lutei.

Como nós, humanos, também fraquejamos
Deixarei gravado aqui o meu luto
Que é para eu jamais me esquecer disso
E prosseguir.

“Senhor,
Fazei-me um instrumento de vossa Paz”.

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Saturday, February 03, 2007

Diário do Avesso - II


Quero matar

É a terceira vez que olho pro relógio, mas não adianta, a hora não passa.
Quando a gente está distante das pessoas que amamos, o tempo não é um bom aliado. Por mais que se conte os minutos, as horas, os dias, meses até...
Tudo começa quando um fato qualquer nos remete uma lembrança. Um sorriso, um abraço, aqueles olhos brilhantes e alegres, aquela besteira que dissemos um dia e caímos na gargalhada... Pronto. Dá aquele negócio estranho no peito que parece que, por mais fundo que se respire, o ar não é suficiente para saciar os pulmões.


Saudade...

Todos sabemos que esta palavra só existe na Língua Portuguesa – inculta e bela. Será que apenas dizer algo que sintetize um sentimento é suficiente para traduzir o que acontece por dentro quando a gente o sente?

Sinto sempre saudade.
Saudade de quem está longe, a uma infinidade de metros - e más condições, e falta de dinheiro, e férias que não chegam - daqui.
Saudade de amigos, com quem muito ri e brinquei, e que o tempo levou e não deixou endereço ou telefone de contato.
Saudade dos animais de estimação que tanta alegria já me trouxeram, mas que a vida também levou de mim.
Saudade de sentar no parapeito da janela e chupar um monte de laranjas, descascadas pela mamãe, vendo as árvores do vizinho balançarem com o vento.
Saudade de quem está perto, mas está ausente, em outra órbita, distante demais para ouvir o meu chamado.
Saudade de alguém que ainda está pra chegar...
Saudade de momentos vividos e que nunca serão repetidos.
Saudade de coisas que sonhei de forma latente e que ainda espero viver. A espera é tamanha que a sensação é a mesma da saudade.

“Eu quis o perigo e até sonhei sozinho
Confesso: assim pude trazer você de volta pra mim
Quando descobri
Que é sempre só você
Que me entende do início ao fim...
E é só você que tem
A cura do meu vício de insistir
Nessa saudade que eu sinto
De tudo que ainda não vi...”


Saudade...
Não é uma palavra bonita.
Não é um sentimento bom.
Não é piedosa, nem consola.


Só é boa mesmo de matar.


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